segunda-feira, 26 de outubro de 2009

Eu vô trabaiá, Sô Zé

Benedito Franco


Papai, o Sô Zé Franco, foi Juiz de Paz de Coronel Fabriciano, MG, durante anos e anos. A pedido do Juiz de Direito, exercia quase um Juizado de Pequenas Causas. As pendências menores, os oficiais de justiça, automaticamente, encaminhavam para ele. Respeitadíssimo. Dizia meu irmão padre, Geraldo Ildeo, que ele tinha a sabedoria e o bom senso salomônicos. A calma personificada, a bondade e a simplicidade de um São Francisco de Assis. Vigoroso e firme nas decisões. Apesar de ter estudado apenas o primário, um sábio e um justo.

A esposa

Recebia as pessoas em um modesto escritório, com um bureau e duas ou três cadeiras.
Em lá estando, entrou uma senhora de uns trinta e poucos anos, mas com aparência de cinqüenta, dirigiu-se a ele:
- Sô Zé Franco, dá um jeito no meu marido. Num güento mais ele. Ele bebe dia e noite e eu trabaio di manhã inté à noitinha. Quando chega em casa, bêbado e todo xujo, ainda me bate e toma o dinheiro que ganhei trabaiano com sacrifício, pra comprá cumida prus nossos fio.
Papai, como sempre, pensou, pensou. Olhou para ela e ela para ele. Ficou em silêncio uns breves minutos.
- A senhora não reage?...
Um "reage" em interrogação, meio longo.
Aí... ela é que pensou. Franziu a testa, sacudindo a cabeça. Olhou para o chão, olhou para o teto e depois de breve pausa olhou para ele:
- Brigado Sô Zé! Inté!
Deu com as mãos para os lados. Saiu apressada.

O esposo

Calmamente papai lia algo, sentado na cadeira do escritório, percebeu ter entrado alguém, mas continuou lendo um pouco mais, até terminar uma longa frase.
Quando olhou para o lado donde surgiu a pessoa, assustou-se, pois um homem apontava um revólver para ele; depois me disse que, pela primeira vez na vida tremeu um pouco, não de medo, mas de receio - não sabia a causa e o que acontecia.
- Sò Zé Franco, foi o Sinhô qui mandô minha muîé mi batê?
Ele, como sempre, calmamente, pensou, pensou. Lembrou-se da tal mulher:
- O senhor é o marido da senhora que esteve aqui há dias, reclamando que o senhor não trabalha, bebe e bate nela?
- É... é ela mermo qui vei aqui...
Papai, firme e categórico:- Olhe bem, homem que bate em mulher é covarde!
O homem com o revólver apontado para ele, num breve silêncio, as mãos e o revolver tremendo. De repente jogou o revólver no chão, ajoelhou-se e de mãos postas suplicou-lhe:
- Ô Sô Zé, pede minha muié pra não me batê mais. Eu prometo qui eu vô trabaiá. Num vô bebê e vô tratá bem ela e meus fio!
- Pede a ela para daqui um mês vir a meu escritório.
Lá se foi o pobre coitado cabisbaixo e chorando.
Depois de pouco mais de um mês apareceu a mulher, agora com melhores semblante e aparência, relatando que o marido voltou a trabalhar, deixou de beber, tratava-lhe e aos filhos muito bem e querendo até que ela largasse o emprego.
Assim era o meu pai...
Uma bela receita para algumas mulheres!

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