sexta-feira, 31 de agosto de 2012

Chora, viola.


dema

Se acaso chora a viola,
eu choro fora de hora;
ao ver que a lágrima rola,
m’envergonho, vou-me embora.

Saudade bate no peito
e arrocha meu coração,
não posso pensar direito,
em mim, sou todo emoção.

Lembro-me dos velhos tempos,
quando eu rifava amores;
hoje, talvez a destempo,
da solidão rifo horrores.

Sinto na alma as agruras
que a vida trouxe pra mim,
u’a cesta só de lamúrias
pr’um viver chegando ao fim.

Se eu fosse meu próprio dono,
teria me garantido
saúde, paz e bom sono,
de amores, o mais querido.

Ei, chora, viola, chora.
Juntos, podemos chorar.
Manda a tristeza “simbora”,
cede à alegria o lugar!

Um tempo ao menos nos resta
de vida com ilusões
para brindarmos em festa,
deixarmos de ser chorões.

Canta, viola, comigo
ou chora, mas de alegria.
Cantar eu gosto e consigo,
pois minha vida inda é dia.





quarta-feira, 29 de agosto de 2012

Procura


dema

‘Stou a caminho no mundo
à procura de meu ser;
desci abismos sem fundo,
escorreguei sem querer.

Andei por trilhas incertas,
certo é que às vezes errei;
deixei feridas abertas,
das quais nenhuma cuidei.

Seguindo por vias tortas,
− Diga, Senhor, se eu o quis! −
vi a morte à minha porta,
como infiel meretriz.

Inda rumo vida a esmo,
vou menino sem pensar,
sequer encontro a mim mesmo,
nunca soube o que é amar.

O meu reino é o próprio mundo,
buscar-me é meu viver.
Na minh’alma, o mais profundo,
grave, Deus, como é meu ser.

 


 

segunda-feira, 27 de agosto de 2012

Por que foges?


dema

Onde estás que não te vejo
ou por que de mim te escondes?
Só acirras meu desejo
de, ao te ver, roubar-te um beijo
e enlevar-te ao muito longe.

Sabes que ando à tua procura,
mas tu foges sorrateira,
instigando-me à loucura
por saciar-te com minha jura
de um amor pra vida inteira.

Aos gemidos de prazer,
tua alma unida à minha,
num só corpo, hemos de arder,
do ocaso ao amanhecer,
em teu leito de rainha.

Quem sabe, este o teu medo,
de não seres mais só tua,
(e que ocultas por segredo,)
dos teus sonhos, sou o enredo,
revelado à mana lua.

Eis que somos prisioneiros
um do outro e do amor;
predizia o cancioneiro:
entre amantes não há primeiro,
ambos, “servo e senhor”.

Se me tens como eu a ti,
não há razão pra te esconderes,
quis o fado fosse aqui,
neste solo guarani,
se cumprissem teus quereres.

Onde estás que não te vejo?
Ah, tu feres meu direito,
só acirras meu desejo
de, ao te ver, roubar-te um beijo
e apertar-te contra o peito.
...




sábado, 18 de agosto de 2012

Rabiscando Jurê ( Homenagem a Juarez Altafin*)

(dema)

Janeiro de vinte e dois,
Jurê viu a luz e a semana de arte
menos de um mês depois.
Nada sei do parto,
mas, de seis, veio o quarto.
Que fora traquinas,
por trilhas e esquinas,
disse mama Aida,
quando ainda em vida.
Nada de intriga.
Deus morava no Rio,
Jurê estudava por lá.
Optou, porém, por estrelas,
diamantes e prata de cá.
Pensem bem:
Jurê PCB!
Quatro amores, o tesouro
desse menino de ouro:
Dona Glória, ora na glória;
na terra, o Direito,
os filhos do peito
e, com a devida vênia, Mariana,
com todo respeito.
Com sua visão de futuro,
Juarez Altafin
não nos quis no escuro:
Universidade enfim.
Dactilos delgados,
dactilografia,
copiosa obra
nasce e nascia:
Romance ou Direito,
aqui trajetória;
também em revistas,
fica em memória.
Amigos do trecho o deixavam vaidoso:
Ernane Fidelis, Mário Veloso,
Walter, Geraldo, Homero Santos,
Darcys e Rondons... foram tantos.
Não quis ser asceta
o colega de Assis,
preferiu ser poeta,
sentir-se feliz.
Mais de uma vez,
gabou-se Juarez,
de Bandeira hoje vivo,
posto já falecido,
pupilo ter sido.
Serve-me a cola,
a falar de escola
e gabar à minha vez:
fui aluno de Juarez.
Juarez o Juiz,
Juarez Professor,
Juarez cidadão,
até agricultor.
Juarez rima com ex,
mas de fato é o que faz
somado sempre ao que fez.
Eis, na simplicidade,
nosso amigo Juarez.

  * Dr. Juarez Altafin é Desembargador Federal aposentado, um dos co-fundadores da UFU- Universidade Federal de Uberlândia.
"Rabiscando Jurê" foi um dos poemas recitados em evento realizado em sua homenagem, no dia 17/08/2012, numa promoção da Assis Editora

terça-feira, 14 de agosto de 2012

Menina feia

dema

Se meu nariz não fosse tão grosso,
maçã gorducha, meu lindo rosto,
nem mesmo assim eu seria miss,
nunca pensei ou também eu quis.
Por que nasceram encaracolados
cabelos pretos em demasia,
ah, fossem lisos com cacheados,
mas jamais negros tais os da tia.
Essas orelhas como de abano
m’enfeiando de frente ou perfil,
tento cobri-las com mechas ébano
posto que sejam como outras mil.
Minha cintura não faz cintura
e meus quadris são grandes pernis,
então me amo ou vou à loucura,
até sou comum nos vários Brasis.
Mas se me vejo do outro lado,
viro cabide de zombaria,
sou anoréxica com carunchado,
onde eu passasse quem não riria?
Inda diriam esbugalhados
os olhos verdes que azedariam
e se azuis, foram disfarçados,
pois não são próprios de u’a Maria.
Se pés de pato ou delgados dedos,
eu não teria farda pra guerra,
pior, escondem algum segredo
que só a morte na cova o enterra.
O que é feiura, o que é beleza,
inconformismo com a natureza,
apenas cisma ante o velho espelho
que o matiz róseo torna vermelho.
Ai, vida ingrata, meu Deus, a minha,
quão me maltrata hoje tão menina,
hei de amar-me qual uma rainha
pra dar amor a quem me fascina.

sábado, 4 de agosto de 2012

Faça-se!


dema


Sim, eu nasci plebeu,
mas nunca fui coitado.
Eu vim pra ser feliz,
filho de Deus amado.
Ainda pequenino,
mamãe, com amor, me disse:
não se prenda a tolice,
tente crescer, menino!
E foi assim que fiz,
sempre me projetando
na vida que eu quis,
nada então esperando.
Eis como o mundo gira,
como a pessoa cresce.
Aquele que não aspira
não sobe, apenas desce.
A vida é do que a faz,
não de quem só reclama.
É bom e satisfaz
dormir na própria cama.
Tire o “eu” deste texto
e serve a todo mundo,
pois é nesse contexto
que não se faz “segundo”.
...